domingo, 22 de julho de 2012


Vivemos na era do pensamento líquido. Inconstantes, intensos, indecisos. Então me ocorre batizar o momento como a grande crise do “i”. Veja, eu esqueci de mencionar o qual em minha opinião é o mais importante “i”, a insegurança. É muito simples, compartilhamos um mundo cheio de possibilidades e quando pensamos nos antigos é inevitável pensar em contextos familiares onde as grandes escolhas significativas como carreiras profissionais, relacionamentos, por exemplo, eram feitas pelos patriarcas, ou seja, o campo de possibilidades daquele jovem automaticamente se tornava restrito e sua vida aparecia delineada em uma grande projeção pelos próximos anos.
            Fomos então evoluindo, pintamos as caras, queimamos sutiãs e ganhamos o “direito” teórico, de decidirmos pela nossa própria projeção de vida. Os demais ganham direito de opinar, manipular talvez, mas a decisão se torna própria. E é ai então que ganhamos novas lentes e passamos a enxergar naquele campo restrito as outras diversas possibilidades, os outros caminhos. A sensação de podemos tudo, que eu vou chamar gentilmente de síndrome da “lua de cristal”, tudo que eu quiser eu vou tentar melhor do que eu já fiz, ou o cara lá em cima vai me dar, me dar toda a coragem que eu quiser pois eu vou tentar a sorte de ser feliz. O começo da grande confusão é que como ser humano, somos um organismo que se auto-regula constantemente para conseguir um tipo de equilíbrio que nos mantenha satisfeitos e dentro de nós existem muitos caminhos para sermos felizes, podemos ter talentos diversos, muitas habilidades, testar todas requer tempo, e alguém já disse um dia “Quem abre muitas portas, acaba não adentro nenhuma verdadeiramente” Não há mais uma voz social que te condene, tudo parece ser permitido o que faz com que as costas dos jovens se tornem largas.
            Fazer uma escolha, nos implica em deixar passar as outras possibilidades, e nesse novo momento afoito de querermos experimentar o gosto de tudo, de tudo que vinha nos sendo negado em nossa história, nos limitamos em começar caminhos e não segui-los até o fim, algo te chama atenção pela trilha e te faz desviar de rumo. Não estou de forma alguma julgando tais fatos como bons ou ruins, mas deixo claro que em minha opinião estamos caindo “de cabeça” às avessas. A intensidade em questão, não é viver o estilo carpediem, “Viva cada dia como se fosse o último”, intensidade para mim é não ter medo de fazer escolhas, e perder as outras, confiar na sua capacidade de decidir. Mergulhar na sua idéia até seu último fio de cabelo, escolher um caminho e acreditar nele mesmo que você venha arrepender-se ou troca-lo de acordo com a sua conveniência, mas se manter crédulo e envolvido enquanto ele durar, não pensando no seu fim, mas pensando em sua evolução. Sou fruto do pensamento líquido, por tanto, se alguém descobrir como se faz isso, eu ficarei muito grata em saber.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Intimidade.


Aquela beleza mortal batizada pelas lentes de imortalidade, me brinda.
Enchem os olhos de clamor, infestam-me e me convocam a ti.

Desafia-me a te oferecer os ombros e tudo mais que tenho;
Tua cor não me distrai, porque sei que teu chamado é de ausência;
É de preto no branco, é singelo, é honesto.

Receosa, te escondes atrás de um holofote que percebe a beleza;
Tuas entrelinhas foram cuidadosamente desenhadas;
Notei e não prossigo sem ti.

Tua morada é segura, tão segura que só meus olhos podem te alcançar;
A força do teu colo me convida a admirar tua solitária estadia,
Porém assusta-me a ponto de partir;

Chamar-te é esforço em vão, tua introspecção me remete a uma intimidade que desconheço;
E invejo, passo a crer que meu desejo de estar contigo se esvai no limite de tua própria companhia.
Te bastas.

domingo, 6 de maio de 2012

Adeus.


Aquela meia taça que você deixou pra trás, secou.
Secou também o meu amor;
Descobri no centro do teto um honesto sentido para me ocupar das lembranças;
Vi-te passar como um filme antigo de aspecto mofado e cansado;
Teus cabelos estavam imaculados no tempo;
Havia brilho, neles e em mim.
Por um momento eu julguei que de tão visceral, teria pra todo sempre um jardim secreto, onde te pudesse re-visitar em meio um devaneio e outro.
Receio que entreguei as chaves do jardim. Elas estavam em um molho com muitas outras; Dei a um estranho e o segui.
Tal quando criança, eu fui seguindo suas pegadas fundas e seguras. Ele me lançou um olhar tímido por detrás dos ombros, em seguida estendeu uma das mãos e eu as segurei de pronto.
O filme ficou no jardim, junto contigo e o que restou. Foi tão secreto que não pude mais haver de volta, nem mediante as preces para São Longuinho.
Não, não.
Não ouso me despedir, mas de certo vislumbrastes o adeus escorrer no beijo protocolado de despedida.
Dói te olhar e não sentir;
Alvo de tanto querer, te deixei perder o sentido com o costume da ausência;
Do nosso mundo emerso, submergirmos e agora voltamos a ser apenas eu e tu;
Vou seguir viagem, aqueles olhos tímidos têm sede;
Bons votos e Boas festas desde já, que a vida seja suave com as tuas mazelas!

quinta-feira, 3 de maio de 2012

O pudor

Lá, ele só via os contornos do seu pudor;
Onde as mãos eram delicadas e gélidas
Permeadas de sorrisos esbranquiçados.
Arde outra vez.

Inquieta a paz de outrora e vibra,
Que quietude mais metida ela tem;
Só quer burlar a tua cara de bobo
Atiçar teu fogo com recusas de entrelinhas.

O pudor se alimenta da tua ira,
Convida-te a revisitar;
Zomba do teu desejo, sapateia na intimidade;
O relance que vê naqueles olhos são súplicas flamejantes ao longe.

Usurpo a atenção, agora é tudo dela;
Está envolvido e entregue aquele joguete
Desfazendo-se do olhar, ela venceu vitoriosa;
Tem a curiosidade dos olhos dele em si.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Cristal do teu olho



No cristal do teu olho eu o vi.
Refletindo com triunfo de ti mesmo.
Vi nas entrelinhas, no pesar da cabeça.
Vislumbrei tua batalha interna.
E do lugar da platéia, não pude fazer mais que apreciar.
Apreciar-te, depreciando a tua guerrilha.
Nos teus segundos de cólera perpétua
Ergui as armas do chão e fui juntar-me a tua guerra.
Avistei tuas formas distantes, no terreno de poeira alta.
Lá, bastava uma única pedra.
Não havia uma alma sequer para contar histórias pitorescas.
Encontrei-te deitado, misturado com a terra e com o vento que a embalava.
Fui então largando as armas pelo caminho até chegar a ti.
Clarificando o confuso esquema tático.
Não tínhamos o inimigo.
Julguei, ele havia fugido.
Fugiu, para as tuas vísceras.
Contemplando-te em meio ao relento, Te estendi a mão.
Olhando-me com súplica, vi no cristal do teu olho.
Não posso fugir de mim mesmo.
És deveras digno.
Tua alegria de viver andou pro extremo oposto.
Tento em vão recordar-te.
Fora do cárcere o lugar é seguro.
Tem gente decente, honesta.
Existem almas amigas, almas poetas.
Existem sonhos que podem ser almejados por todos!
Por apenas a bagatela da sua coragem.
Com teus olhos tristes de ressaca, ressaca da vida.
Lembra-me da miséria.
Miserável ser humano.
Apodrece tudo que toca.
Vejo a linha tênue dos teus sinais vitais entre a terra e os céus.
Num ato de te devolver a vida.
Rogo as preces a Maria das Dores tua reles protegida.
És escada, minha estrela.
Com pesar, anuncias tua morte.
Um pouco antes de debruçar-me sobre teu corpo.
Abraças-me e sorri.
Cara amiga te digo que matei, mas matei o pior de mim.
No cristal do teu olho, eu vi.
Não mais o medo.
Vi o desejo de voltar de braços dados para o mundo dos sonhos.

terça-feira, 24 de abril de 2012

Silêncio.

Hoje não é dia de rima, nem de poesia e versos sensíveis. Hoje é dia de verdade, daquelas que de tão honestas dilaceram qualquer tentativa de justifica-la. Sim porque, essas são tipo que desconforta o sujeito, sacode as bases e te convoca a pensar e aí eu me pergunto quem quer pensar?
Quando eu era pequena minha avó dizia alguns ditados interessantes, daqueles que a maioria de nós também costumava ouvir dos mais antigos. Havia dias que eu ia visita-la e tentava fazer um pequeno resumo do que tinha acontecido na minha semana, ou seja, contava as emoções de ser uma aluna de fundamental e ela escutava atentamente, parecendo se deliciar com cada nuance do meu semblante, que se alterava com os fatos. Certa vez fui visita-la enraivecida, naquele dia eu tinha experimentado pela primeira vez, que eu pudesse me recordar, uma decepção e foi uma decepção daquelas dolorosíssimas, que envolvia a melhor amiga e o amor platônico. Por tanto, eu estava arrasada, injustiçada, experimentando pela primeira vez o tal do coração partido, com vontade de esbravejar com o mundo, desejando secretamente que um raio caísse na cabeça dos traidores, aliás, nem tão secretamente. Foi então que minha avó me disse: “Minha filha, não faça nada, o mau se destrói sozinho, tudo o que fazemos de ruim retorna pra nós porque aqui fazemos e aqui pagamos! Aquiete seu coração, e siga seu caminho”. Dá pra imaginar que quando se tem onze anos é difícil absorver tais palavras, existia dentro de mim uma ansiedade e mais do que isso uma necessidade humana de vê-los sofrer da mesma forma que eu estava sofrendo, se o mundo iria fazê-los pagar tinha que ser logo.
Os anos se passaram, a idade veio e com ela o amadurecimento. E então eu entendi o que significava a frase da minha avó. Quando eu era criança, parecia uma frase mística até divina, aonde o destino iria se responsabilizar por quitar as dívidas de alguém, ou Deus o faria. Há quem ainda acredite, embora me pareça um pensamento mágico e uma forma de nos pouparmos de tal aborrecimento. Acontece que cada atitude gera uma reação, alguém que prática um determinado mau, não o faz só porque se irritou com os seus lindos olhos, faz porque isso é algo permitido dentro da construção do seu caráter ou da falta dele. Por tanto as atitudes consideradas negativas vão continuar sendo executadas por essa pessoa para além de você e em algum momento outra pessoa irá reagir. Dessa forma, ainda acho mais adequado o termo, “colhemos o que plantamos” do que “Aqui se faz, aqui se paga” Paga pra quem? Paga por quê? É como se ao fazer essa afirmativa, estivéssemos tirando o direito do sujeito de se implicar no que ele faz, ele não paga simplesmente porque outro sujeito não aprova a sua conduta, ele colhe exatamente o que ele semeou e cultivou durante as experiências da sua vida. Afinal de contas, não se pode plantar uvas e querer colher maçãs.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Flor de Lotus

Foi crescendo torto como trepadeira
Rameando-se entre as frestas de um muro de jardim
Impregnando a alma de uma sufocante e verde calmaria
Lugar ambíguo, onde as asas criam raízes

Mazelas de uma vida milimetricamente expostas pela falta de bom senso
O muro posto a baixo como o de Berlim
Lodo por todos os lados
A dor refletida na lama, no engodo, na cama

Da cama fez-se ilha
Com pés de fora era possível sentir a lama entre os dedos
Medo degustado pouco a pouco, digesto
Andaram lentamente, até submergir

Emergiram juntos e limpos
Como Flor de Lotus
Amaram-se por toda a vida de um devir
Encantaram-se com a beleza que brotou do lodo

Descobriu-se a aventura de crer
Com a certeza que o que é bom, dura o tempo exato para ser sempre pouco
Entre um suspiro e o mergulho
E não há redoma no mundo que proteja a flor de lótus de si mesma